Passados seis anos de sua morte, a vereadora carioca Marielle Franco (PSOL-RJ) passou a compor o hall de figuras históricas utilizadas pela esquerda para inspirar protestos sociais e campanhas políticas eleitorais. O trágico assassinato transformou involuntariamente a parlamentar em causa política, cacifando sua irmã, Anielle Franco, para o Ministério da Igualdade Racial no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a viúva, Monica Benicio, para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
O caso envolvendo a vereadora voltou a repercutir após a prisão do deputado federal Chiquinho Brazão e de seu irmão Domingos Inácio Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), no domingo (24). Eles foram apontados pelo executor do crime, Ronnie Lessa, como os mandantes. O motivo do assassinato envolve a disputa em torno da regularização imobiliária de terrenos irregulares controlados por milicianos no Rio de Janeiro.
O crescimento do PSOL no cenário eleitoral nacional em 2018 coincidiu com o assassinato da vereadora. Em comparação com 2014, a sigla saltou de cinco para 10 deputados federais. O movimento também se repetiu em 2022, quando a legenda elegeu 13 parlamentares. Já na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), a sigla passou de três deputados para cinco nos respectivos anos, e na Câmara Municipal, o partido foi de seis para sete vereadores em 2020. Mas não é possível fazer uma relação direta de causa e efeito ente o crime e o crescimento da bancada.
Além da repercussão eleitoral, Marielle ganhou uma rua em Paris, virou tema de um Projeto de Lei (PL 1086/2023) - que trata da violência política - e foi homenageada por diversas turmas universitárias ao longo desses seis anos. Na avaliação do cientista político Adriano Cerqueira, docente do Ibmec de Belo Horizonte, esse cenário favoreceu o PSOL nos últimos pleitos.
“O PT, nesse período em que ocorreu o crime, enfrentava uma crise devido às investigações da Lava Jato e parte do eleitorado passou a ver nos candidatos do PSOL, especialmente em grandes cidades, uma alternativa à esquerda. O caso de Boulos com sua candidatura em São Paulo é um exemplo”, disse o cientista político.
Cerqueira também destacou que a vereadora carioca se tornou uma "bandeira" política. Na opinião dele, com a identificação dos mandantes do crime, a estratégia do partido tende a envolver algum tipo de aproveitamento da situação, especialmente fazendo críticas à demora das investigações.
Esquerda usou a morte de Marielle para desgastar Bolsonaro
O caso envolvendo a parlamentar também foi utilizado pela esquerda para desgastar o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados mais próximos, como o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ). Bolsonaro chegou a ser apontado por críticos como suspeito do assassinato, pois o pistoleiro Lessa morava no condomínio Vivendas na Barra da Tijuca, onde Bolsonaro também residia. Nas nunca qualquer ligação foi provada.
A emissão de passaporte diplomático feita pelo Itamaraty durante o governo Bolsonaro para Chiquinho Brazão e Domingos Brazão foi levantada como evidência de ligação entre o ex-presidente e o assassinato de Marielle. A tentativa de incluir outros membros da família Bolsonaro no caso também pode ser observada. O filho do ex-presidente, Jair Renan, também entrou na linha de ataques feitos pela esquerda após Lessa confirmar que sua filha namorou o caçula do ex-presidente.
O nome da vereadora também foi usado por Lula para atacar Bolsonaro durante o debate na TV Bandeirantes em 2022. A declaração foi feita após o presidente Jair Bolsonaro tentar associar ao petista uma suposta ligação com Marcola, líder do Primeiro Comando da Capital (PCC).
"O candidato sabe que quem cuida do crime organizado não sou eu. Quem tem relação com miliciano e crime organizado, ele sabe que não sou eu, e sabe quem tem. Sabe inclusive da culpabilidade do crime organizado que matou a Marielle no Rio de Janeiro", afirmou o petista na época.
Por ter tido uma discussão com a colega de Câmara Municipal, Carlos Bolsonaro chegou a ser apontado por críticos da esquerda, através de depoimentos à imprensa, como um suposto envolvido na morte da parlamentar.
A discussão em questão teria acontecido em 3 de maio de 2017, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Segundo Carlos, a discussão começou quando o assessor de Marielle, durante uma entrevista, o provocou chamando-o de fascista. Após o assassinato de Marielle, assessores da parlamentar relataram à imprensa o ocorrido e o caso acabou acabou sendo questionado pela PF durante as investigações do crime.
Ao ser ouvido na condição de testemunha, em 2019, o vereador relatou o ocorrido e disse que mantinha um relacionamento "respeitoso e cordial" com Marielle, apesar das divergências políticas.
Comentando a questão, o cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), analisa que “é inegável a instrumentalização política do caso Marielle por parte da esquerda”. Ele cita que a nomeação de Anielle ao posto de ministra de Estado atesta a afirmação e comenta que o Partido dos Trabalhadores também conseguiu capitalizar a tragédia envolvendo a vereadora.
“A imagem da vereadora, nesse sentido, serviu a dois propósitos: auxiliar o petismo a se manter relevante na política nacional e atacar o ex-presidente Jair Bolsonaro ao tentar vincular algum envolvimento direto ou indireto do ex-mandatário", disse o cientista político.
Negativa da federalização visava manter pressão sobre governo Bolsonaro
O pedido feito pela família de Marielle, amigos e políticos de esquerda para que a investigação policial não fosse federalizada, em 2020, foi visto como um movimento político.
Na época deputado federal pelo Rio, Marcelo Freixo (PSOL) criticou Bolsonaro de querer “federalizar o caso Marielle a todo custo para controlar as investigações”. A declaração ocorreu em meio à pedido feito pelo então ministro da Justiça, Sergio Moro, para que a PGR instaurasse um inquérito para apurar depoimento que citou Bolsonaro no caso. A acusação implícita era que a PF poderia agir favoravelmente ao ex-presidente.
Anteriormente, pedido de federalização do caso foi feito pela então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, indicada por Michel Temer. O pedido chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que o negou alegando ser uma "invasão de atribuições". Com isso, o caso foi mantido sob o comando da Polícia Civil e do Ministério Público do Rio de Janeiro.
Na segunda-feira (25), Freixo, atualmente presidente da Embratur, mudou o discurso e afirmou que o caso só foi resolvido porque foi federalizado por Lula.
“O crime da Marielle [sic] só foi solucionado porque o Lula assumiu o poder e mudou a Polícia Federal. Se não fosse isso, não teria sido resolvido o caso Marielle. Ponto”, disse o ex-deputado.
Fonte: Gazeta do Povo
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